Vida Prática

A INFLUÊNCIA DO REV. RYOSHI IIZUKA NO CENTRO-OESTE BRASILEIRO

Não há ninguém que, tendo ouvido falar do Ryoshi ou que tenha lido alguma coisa do Ryoshi, ou que tenha tido alguma informação a respeito dele, que não se sinta com vontade de ser missionário” (Rev. Ruy Anacleto)

Dentre as muitas qualidades do Rev. Ryoshi, uma era fundamental, ou seja, a valorização da concepção protestante de que a educação e a religião eram duas forças indispensáveis para que uma sociedade vivesse em harmonia e segurança. Para ele, o êxito das transformações que o protestantismo procurava desenvolver nas pessoas e na sociedade aconteceria em grande parte por meio da educação. Nesse sentido, como afirmava Paulo Freire, “se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela, tampouco a sociedade muda”.

Ryoshi nasceu no Japão em 15/8/1915, e, na infância, estudou na Escola Imperial de Tóquio, onde seu pai lecionava. Partilhou da amizade do príncipe Mikasa, irmão do imperador Hiroito, frequentando o palácio por várias vezes. Antes de imigrar para o Brasil, se graduou em técnicas agrícolas, com especialidade em jardinagem e pomicultura.

De acordo com o Rev. Ruy Anacleto, seu melhor amigo de ministério, Ryoshi era homem de muita leitura, com facilidade em três línguas, japonês, inglês e português. Atualizado em seus conhecimentos, aproveitava suas leituras para se aproximar das principais correntes teológicas que tratavam a respeito da integralidade do evangelho. O Rev. Richard William Irwin afirmou que Ryoshi não se preocupava somente em salvar almas, mas em melhorar a vida total das pessoas da roça.

Ruy Anacleto também afirmou que seu amigo não queria apenas aumentar o número de crentes da igreja, mas lutar para que o nível de vida do povo fosse melhor em todos os sentidos. Isso fica evidente quando, ao descrever a necessidade do sertanejo goiano, Ryoshi perguntou: “Pode a gente só pregar o evangelho dos pensamentos e ajudá-los só com palavras? Para que, então, sou agrônomo, fui lavrador, conheço o alfabeto? Para guardar tudo isso em silêncio, para, sozinho, eu ter a vantagem e ser orgulhoso em saber mais que os sertanejos?”. E. não satisfeito, completou: “Não seria isso ser egoísta em não ensinar a ninguém o que conheço e exceder os ‘talentos emprestados’ a mim?”.

Goiás era a menina dos olhos de Ryoshi, e ele assimilou a cultura local de maneira tão intensa que, ao pedir oração pelo povo, dizia: “Não esqueça de orar por ‘nós’ goianos”. Em Mato Grande, Luziânia, GO, realizou o sonho de iniciar a Escola Agrícola Evangélica do Oeste, que funcionou por cinco anos e fez grande diferença na vida das pessoas da região. Os alunos se mantinham, trabalhando na lavoura.

A intenção era a de que, ao completar os estudos, o aluno tivesse condições de sair “equipado para se valer da lavoura progressista, para trabalhar na igreja, para dar nova vida ao pessoal”. O projeto era mantido por meio da formação de laranjeiras em volta da “Casa Escola Rural”, e os pais dos alunos aprendiam a cuidar delas.

Os recursos obtidos por meio da comercialização das frutas sustentavam a escola e pagava o ordenado da professora. Percebe-se que sua preocupação com a expansão do trabalho missionário seguia de mãos dadas com o desejo de prestar serviço e promover a vida.

“Pode a gente só pregar o evangelho dos pensamentos e ajudá-los só com palavras? Para que, então, sou agrônomo, fui lavrador, conheço o alfabeto? Para guardar tudo isso em silêncio, para, sozinho, eu ter a vantagem e ser orgulhoso em saber mais que os sertanejos?”.

Ryoshi IIzuka

A Escola contava com um ambulatório e o Ryoshi utilizava seus conhecimentos para atender os doentes, uma prática comum onde o serviço de saúde do Estado não chegava. Afirmava que era feliz na arte de ser o “rei caolho na terra dos cegos”. Dessa preocupação com a saúde, surgiu a Associação Evangélica de Auxílio Mútuo, que tinha por objetivo conceder aos sertanejos os primeiros socorros, visto que moravam distantes das cidades.

O Rev. Ryoshi não tinha receio de dividir seus conhecimentos e desenvolvia habilidades extraordinárias nas pessoas com as quais ele trabalhava. Uma dessas vidas foi a do amigo e vizinho Presb. Gérson José Bueno. Esta foi uma amizade que rendeu frutos missionários em Rondônia.  

Engana-se quem pensa que o estilo de liderança do Rev. Ryoshi, voltado para a prática social, estivesse desvinculado da participação das igrejas que pastoreava, pois fazia questão de envolvê-las. Insistia na importância de professores crentes nas escolas primárias e na necessidade de pessoas com princípios do evangelho para desempenhar cargos de responsabilidade. Nesse aspecto, a igreja era um celeiro para forjar líderes conscientes nessa direção.

Em Brasília, “Capital da Esperança”, o Rev. Ryoshi deu assistência ao primeiro núcleo de presbiterianos independentes juntamente com o Rev. Silas Silveira e o Rev. Plácido Baldani, além dos Presbs. Esaú de Carvalho, Carlos Pereira Brasil, Othoniel Amaral, Durvalino Alves Frades, e os Diacs. Euclides Lobo e Terezinha de Souza Silveira. Isso demonstra a capacidade do Rev. Ryoshi de trabalhar em equipe.

A maneira de liderar do Rev. Ryoshi não direcionava para si mesmo os méritos dos trabalhos, mas os distribuía generosamente aos que com ele participavam dessa empreitada missionária presbiteriana independente em terras do chamado “Novo Brasil”. Não havendo iniciativa da cúpula da igreja quanto à visão missionária para a Capital que brotava no Planalto Central, restava a quem estivesse mais perto o dever de assumir essa tarefa.

Os Revs. Ryoshi e Silas Silveira eram líderes que não fugiam a esse tipo de responsabilidade, não apenas porque não existia quem o fizesse, mas porque, como líderes visionários, preferiam olhar para as soluções ao invés de olhar para os problemas. A aceitação frente a esse compromisso culminou na construção de um pequeno templo de madeira, que acolheu a congregação da IPI do Brasil em 29/12/1957, na futura capital federal, e o pregador nesse dia foi o Rev. Ryoshi. Com a transferência do Rev. Silas, o Rev. Ryoshi continuou cuidando do nascente trabalho, uma vez que a congregação passou a pertencer à IPI de Luziânia, pastoreada por ele.

Com profunda visão evangelística, o Rev. Ryoshi também esteve presente no início do trabalho presbiteriano independente no Mato Grosso, no fim da década de 1940, por meio de pregação nas casas das famílias. Teve, ali, o privilégio de ser o primeiro evangelista a pregar nesse projeto de implantação de igrejas. O trabalho inicial foi em Cassilândia, na região nordeste do atual Mato Grosso do Sul. Esta ação foi fruto da visão missionária e da expansão das igrejas goianas, especialmente da igreja existente na Fazenda Campeira, atual IPI de Jataí. 

Em 1973, foi organizada a Congregação de Pimenta Bueno, em Rondônia, e o Rev. Ryoshi fez questão de ressaltar a participação da IPI de Jataí (comparada à Antioquia dos tempos apostólicos), como marco concreto do trabalho missionário empreendido nessa região. Mais uma vez, ele percebeu que os campos estavam prontos para a colheita, e não era por falta de trabalhadores que o trabalho deixaria de ser realizado.

Como líder, era abnegado e tinha como prioridade sua vocação, apesar das dificuldades, pois concebia o ministério como algo que deveria ser exercido para a glória de Deus, motivo que o fez viver em meio a desafios e lutas. Se aliarmos: visão integral do evangelho, senso crítico diante das crises, consciência de chamado, amplo leque de capacidades para servir, abnegação e confiança na providência divina, dá para afirmar que a liderança transformadora do Rev. Ryoshi ultrapassou as fronteiras do Centro-Oeste brasileiro.

Por isso, sua dedicada esposa Angelita, que foi seu apoio incontestável, escreveu que “ele foi de plena dedicação ao Evangelho de Cristo e à Igreja de Deus, e serve de exemplo aos nossos jovens presbiterianos independentes e a seus netos e bisnetos”.

Ryoshi Iizuka foi chamado pelo seu Senhor em 21/7/1994, dia em que a terra ficou mais pobre por perder um servo bom e fiel. Aproprio-me da expressão que dona Angelita utilizou ao se referir ao esposo e servo, Ryoshi, dizendo: “Deus seja louvado por sua vida consagrada”.

Rev. Marco Antônio Barbosa
Pastor da 7ª IPI de Londrina, PR
Capelão

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