O CAMINHO DA IGREJA
A IPIB celebra neste mês de julho 117 anos de história enquanto denominação cristã. Por certo, há muito para celebrar. Podemos dizer como Samuel “Ebenézer, até aqui nos ajudou o Senhor” (1Sm 7.12). “Até aqui” aponta que cremos que Deus cuidou da sua igreja no passado, mas que igualmente está conosco no aqui e agora, e nele esperamos para concretizar a sua missão no mundo.
Celebração é importante. Não a celebração das obras das nossas mãos, mas daquelas que Deus confirma com as suas (Sl 90.17). Celebração sem reflexão, todavia, é alienação, assim como reflexão sem festa, alegria e regozijo é tediosa.
Celebramos por aquilo que Deus é e faz através de nós. Mas, quando refletimos sobre o que somos e fazemos, envergonhamo-nos. Não poderia ser diferente. Afinal, mesmo que façamos o melhor que podemos, sempre seremos “servos inúteis” (Lc 17.7-10). Ter consciência disso nos livra da arrogância de confiar demais em nossas potencialidades.
Para continuarmos neste caminho de ser igreja fiel a Jesus precisamos abrir nossos olhos para encarar as crises e desafios do nosso tempo. Afinal, a crise toma conta de todos os setores da sociedade organizada. A crise está na sociedade e suas instituições. A crise está no coração dos homens e mulheres. A crise do mundo é que o nosso autogoverno está desgovernado e nossas seguranças são inseguras.
E a igreja está em crise? Depende de como definirmos “igreja”. No sentido exato, a “igreja” jamais está em crise. Disse Jesus: “As portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16.18).
As instituições, sim, entram em crise. Os modismos, os líderes que dizem ser os salvadores da igreja, os programas, métodos e as fórmulas, sim. A nossa parte de influência e gerência na igreja de Cristo entra em crise, mas a igreja de Cristo jamais. Por outro lado, dialeticamente, como a igreja é formada por nós, homens e mulheres, está sempre em crise. Portanto, sempre nos chamando à reflexão, à mudança, à reforma.
O retorno ao caminho
Se há algo que precisamos aprender na leitura das Escrituras e da história da igreja é que a saída de qualquer crise na igreja é causada por nós mesmos e não está no novo, mas no antigo. Não no futuro das nossas vãs imaginações e soluções mirabolantes, mas no passado sempre presente que ilumina o futuro inaugurado por Deus em Cristo.
Portanto, a saída da crise da igreja, mas também a mensagem da igreja para o mundo em crise, é o retorno. É uma volta.
O retorno, que é a nossa saída da crise de ser igreja, nada tem a ver com tradicionalismo. O retorno que precisamos começa com um olhar para os nossos pés, se eles estão seguindo no Caminho certo. Um olhar para o coração para perscrutar se ele está com sentimentos certos. Um olhar para a nossa mente, se ela está pensando as coisas certas. É um olhar para o nosso propósito de existir, se estamos vivendo e agindo como deveríamos viver e agir.
O caminho proposto por Jesus para a sua igreja andar não pode ser reduzido a um meio, a um método ou uma estratégia. O Caminho é Ele mesmo. O Caminho é vida ofertada por Deus. E esta vida ofertada por Deus não entra em crise. A igreja que vive no Caminho da Vida e da Verdade expressa vida e promove a vida.
Nossas crises enquanto denominação apontam que algo está errado. E, neste mundo dependente de novas tecnologias e de especialistas em seu engenho, logo alguém se ergue propondo que precisamos é de um ‘especialista” que nos ensine também a ser igreja. Pululam ofertas de soluções na mesma proporção dos fracassos. E, para obter sucesso, muitas “igrejas” crescem ao preço da negação do Evangelho de Cristo.
Precisamos voltar e ver onde nos perdemos.
Jesus disse: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14.6). O que isso significa para nós, IPIB, nos dias de hoje?
A compreensão de que Jesus é o Caminho era tão peculiarmente forte na igreja em seus primeiros séculos que, em Atos dos Apóstolos, por 6 vezes os discípulos de Jesus foram designados como “os do Caminho” (At 9.2; 19.8, 23; 22.4; 24.14, 22).
Falar que Jesus é um trieiro ou vereda soa estranho. Sabemos que se trata de uma metáfora. Jesus é o Caminho no sentido de que seus discípulos, os que seguem os seus passos, devem andar como ele andou em todo tempo, sem desviar por outros atalhos.
Sabemos, então, que esse caminho diz respeito àquilo que Jesus é para nós. Nosso Senhor: seguimos os seus
passos. Nosso Salvador: sabemos que, seguindo neste caminho, andamos na esperança da salvação já nos
ofertada por Ele.
O caminho é a mensagem e a vida da igreja
O Caminho, que é Jesus, é tanto a Palavra de Deus para a igreja em suas crises, quanto a palavra da igreja para o mundo em suas crises. É tanto o agir de Deus em nossa direção, quanto o agir da igreja na direção do mundo.
Jesus, o Caminho, abre caminho e define nosso jeito de ser igreja, nossa mensagem e nossa ação. Nossa palavra e nosso comportamento. A liturgia do culto e a liturgia da vida.
Jesus, o Caminho, caminhou para a cruz. A sua morte na cruz é a nossa redenção, deu fim à nossa culpa, concedeu perdão, salvou os eleitos de Deus Pai.
Esse Caminho define as escolhas dos discípulos de Jesus. Define as escolhas da igreja de Jesus.
Qual mensagem temos pregado? O caminho é de verdade.
O caminho é de amor em ação, que se doa.
O caminho é de esperança, que não permite que os olhos se percam nos tesouros deste mundo e não goze no
agora a alegria da glória do porvir.
O caminho é de fé e conhecimento. De fé em Jesus e não de fé na fé. De fé que vê além das conjecturas e ideologias deste mundo. De conhecimento, por saber que crer também é pensar. De conhecimento da Palavra. De conhecimento do poder de Deus. De vida no mover no Espírito Santo.
O caminho é de doação e abnegação, de compromisso, de conversão e nova vida, de justiça e solidariedade, de exortação ao pecado, de profecia que edifica, encoraja e consola os homens e mulheres (1Co 14.3).
O caminho é da vida. Da vida abundante que enche nossos lábios e nosso coração, e nos coloca a caminho da promoção da vida, contra todas as faces da morte e dos matadores. Sim! Porque não são as armas que matam, mas porque não há pão para saciar a fome. O que mata são os seres humanos violentos, que não andam no caminho da paz. O que mata são seres humanos egoístas, que não andam no caminho da solidariedade.
O caminho é a esperança da igreja
Um dos sinais mais claros resultantes das crises políticas, sociais e de fé/conhecimento é o estado de
desnorteamento e desorientação. Ouve-se com frequência nestes dias: “Não sei o que será desse país…”;
“Não sei o que será de nós depois desta pandemia…”; “Para onde vamos?”
A igreja, contudo, não está perdida. A igreja sabe o Caminho, também sabe aonde este Caminho leva-nos. É
isso que nos dá esperança e anima nosso coração para não nos desanimarmos na longa caminhada. Tal
esperança é renovadora. Não é a esperança alienadora, mas esperança comprometida em tornar os sinais do
Reino de Deus concretos neste mundo! A nossa oração é: “Venha o teu Reino; seja feita a tua vontade,
assim na terra como no céu” (Mt 6.10).
Conclusão
O mundo após esta pandemia não será o mesmo. Em muitos aspectos, mudanças de hábitos adquiridos agora
serão incorporados definitivamente. E, nós, igreja? O que este tempo com as portas fechadas, cultos online,
distanciamento entre os irmãos, provocará em nós?
Na crise, podemos usar dois subterfúgios: a alienação, um elemento de fuga; ou a revolta, que é uma força
exagerada, mas na direção errada.
Em qualquer tempo, especialmente em tempos de crise, a igreja precisa saber que é o povo do Caminho, que tem um Senhor e um Salvador, que tem uma mensagem, que tem uma esperança.
Celebremos os 117 anos da IPIB, a igreja que somos, mas sem deixar de refletir sobre o caminho que precisamos continuar trilhando em obediência à nossa vocação de ser igreja de Jesus.
Rev. Ézio Martins de Lima
Pastor da IPI Central de Brasília, DF
1º vice-presidente da Diretoria da Assembleia Geral da IPIB