DIREITOS HUMANOS E DIACONIA
Direitos Humanos são um tema mais bíblico do que muitos imaginam. A afirmação de Jesus “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10.10), embute uma discussão que extrapola a dimensão espiritual e atinge o campo do direito. Ninguém tem vida em abundância se seus direitos fundamentais não são atendidos.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, promulgada em 10/12/1948, nasceu de um contexto em que se fez necessário fixar aquilo que seria direito inerente à existência humana, uma vez que os acontecimentos mundiais que a antecederam (principalmente duas guerras mundiais) deram mostra de que o mundo tinha perdido a consciência de que sem direitos não se pode falar em “vida em abundância”.
Basta uma leitura rápida nos 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos para se perceber que os princípios do Evangelho de Cristo estão embutidos em todos eles! Esta declaração é claramente inspirada no ensino de Jesus Cristo
A Constituição Federal brasileira salienta que nosso povo gozará de direitos humanos fundamentais, sendo direito de todos uma vida marcada pelo princípio da cidadania, da dignidade da pessoa humana, sendo certo que são inalienáveis o direito à vida, à igualdade, à liberdade, tanto no campo individual como no coletivo.
O episódio da instituição da diaconia (At 6) embute uma clara discussão a respeito dos direitos humanos. Algumas viúvas estavam experimentando dificuldades e privações de alimento. Não se discutia apenas o direito ao alimento, mas estava em jogo a dignidade da pessoa humana. Neste momento, se instaurou na história, oficialmente, a “Igreja Diaconal”: aquela que se preocupa com o outro integralmente.
O exercício da diaconia está intimamente ligado aos princípios dos direitos humanos, que refletem os princípios pregados e vividos por Jesus Cristo.
Os direitos humanos estão entre os assuntos que a igreja precisa urgentemente retomar e assumir como base para o seu trabalho. O Ministério de Ação Social e Diaconia (MASD) de cada igreja precisa absorver os princípios de Cristo e lutar para que os direitos humanos sejam resgatados, respeitados e implementados, a começar pelo entorno das nossas comunidades.
Em tempos difíceis como o que estamos atravessando, em que pobreza, desemprego e desamparo social atingem milhões de pessoas no nosso país, uma igreja diaconal, comprometida com a garantia do direito à vida e à dignidade humana, se mostra indispensável.
Ao discutirmos Direitos Humanos, não nos cabe julgar as pessoas pela sua condição social, confissão religiosa, viés político, envolvimento com crimes ou se nos sentimos atraídos/repelidos pela sua figura. Lembremos: os direitos humanos apenas refletem os princípios cristãos que todos nós precisamos propagar.
O lugar do “julgamento” que muitos ocupam quando tratam de direitos humanos os impede de perceber que Jesus jamais negou direitos às pessoas, ainda que estivessem mergulhadas em práticas ilícitas e imorais. O relato da mulher adúltera, que sofreria apedrejamento até à morte, é um exemplo claro disso. Embora ela estivesse flagrantemente envolvida num ato ilícito e imoral, no entender de Jesus, os preceitos religiosos não poderiam se sobrepujar ao direito à vida!
O mesmo acontece no relacionamento de Jesus com Zaqueu, o publicano. Sua prática era imoral, perversa, opressora. Todos o reconheciam como um corrupto. Mas o direito a ser reconhecido que merecia a graça de Deus e a experimentar uma vida em abundância estava acima de qualquer condição!
Deixar o lugar do julgamento é a primeira atitude a ser implementada numa igreja diaconal. A segunda atitude é extrapolar o circuito da discussão do tema dos direitos humanos e partir para a implementação de práticas objetivas de defesa e combate das situações que afetam o direito à vida das pessoas que vivem no entorno das nossas comunidades.
Para isso é indispensável investimento financeiro. Empoderar nosso MASD com recursos financeiros é uma mostra de que não estamos presos ao discurso, mas abraçamos a causa do “pobre e da viúva”, demonstrando que, como Cristo, não somos indiferentes a eles. Muito mais coisa boa poderia ser feita nas nossas igrejas se houvesse a visão do investimento na diaconia.
E a terceira atitude de uma igreja diaconal é assumir uma postura profética de denúncia do desrespeito aos direitos humanos mais fundamentais a que nosso povo vem sendo submetido. Nosso silêncio tem sido interpretado como indiferença aos pobres e marginalizados. É o nosso silêncio que tem impedido o mundo de perceber o quanto nossas igrejas têm contribuído na diminuição da fome e da pobreza.
Mudança de atitudes são necessárias a nós o tempo todo. Quanto ao tema do Direitos Humanos, a mudança não se faz apenas necessária, mas urgente.
Por fim, Direitos Humanos não podem ser discutidos apenas sob o prisma político. Defendê-los é um dever de todo cristão que acredita, de verdade, na afirmação de Jesus: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância”.
Rev. Esny Cerene Soares
Pastor da IPI de Vila Dom Pedro I, São Paulo, SP
Secretário de Educação Secular da IPIB