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CULPA E DESCANSO

O elogio ao excesso de trabalho deixa as pessoas aprisionadas na ideia de que estão sempre fazendo menos.

Está chegando o final do ano quando a maioria das pessoas se prepara para descansar. O período de férias, ou descanso, é ansiosamente planejado e esperado o ano inteiro. No entanto, alguns trabalhadores muito cedo já começam a se sentir culpados por terem de “deixar o trabalho” por dez, vinte ou trinta dias.

Os momentos de descanso e lazer são obrigatórios e necessários, seja por pequenos ou longos períodos. Nós, cristãos, separamos o domingo para descansar. Já na cultura judaica, da sexta-feira à noite ao pôr do sol de sábado não se pode trabalhar. É oShabat judaico. Os muçulmanos, por sua vez, descansam na sexta-feira. 

O tempo de descanso também é obrigatório no ordenamento das leis trabalhistas que, ao firmarem horários de trabalho, direitos a períodos de folga e férias, estabelecem que os trabalhadores gozem do seu tempo de descanso.  

Estudos dão conta de que o excesso de trabalho e longos períodos sem descanso são extremamente prejudiciais à saúde mental, e que o tempo de inatividade é necessário para restaurar a atenção e a motivação, e para estimular a criatividade e a produtividade. 

Porém, a sensação de culpa e a sensação de estar “perdendo tempo” durante o descanso existe, e é mais comum do que se imagina. Segundo a psicanalista Ingrid Figueiredo, “esse sentimento é coletivo e afeta a todos, principalmente as mulheres”. 

Para Ingrid, essa sensação está intimamente ligada a uma contradição imposta pelo próprio discurso do sistema capitalista, que valoriza o consumo, a produtividade e a alta competitividade. “Para consumir, é preciso ter lucro, mas de onde vem esse lucro? No caso das pessoas comuns, vem por meio do trabalho. Então, internalizamos que precisamos trabalhar mais. Ao mesmo tempo, o indivíduo tem o direito por lei de descansar, mas retira esse direito de si mesmo pela culpa quando internaliza que, para chegar ao topo, não pode parar de trabalhar. Mas será que precisa mesmo?”, pergunta a psicóloga. 

Vale lembrar que o trabalho dá sentido à vida, e é através dele que produzimos e nos sentimos vivos, mas não precisa ser uma tortura. As pessoas se reconhecem e são reconhecidas pelas suas atividades e isso é importante, mas o elogio ao excesso de trabalho as deixa aprisionadas na ideia de que estão sempre fazendo menos, e que sempre devem demonstrar que estão produzindo.

Com a intensificação do trabalho remoto, a necessidade de trabalhar mais se intensificou. A casa transformou-se em um grande local de trabalho sem períodos de descanso, o que tem causado problemas como estresse, insônia, compulsão, consumismo, pânico, depressão, etc. Quando isso acontece, o trabalho se transforma mais em uma fonte de mal-estar do que de prazer.

A reflexão e o questionamento sobre a nossa relação com o trabalho e nossos limites são necessários para facilitar a forma como lidamos com essas questões.

Faz-se necessário repensar a nossa forma de lidar com nossas obrigações laborais e, principalmente, com os períodos de descanso, sem culpa.

Nesse mundo de conexões hiper-rápidas e a necessidades de mostrarmos ao mundo a nossa vida em tempo real, sair para descansar e não ligar os dados móveis representa uma prática quase impossível para a maioria das pessoas, sem falar do vício de querermos nos inteirar do que está acontecendo no mundo e a sensação de que “deixamos para trás” as melhores notícias.

Ao que parece, todo esse arcabouço passou a fazer parte dos nossos supostos dias de descanso.

Enfim, se continuamos pensando que somos incapazes de descansar, precisamos perguntar: por que motivo nego a mim mesmo um merecido descanso? Ou será que o meu mundo acaba se não estiver disponível?

Afinal, recarregar baterias é de suma importância. Programe seu descanso!

Revª. Ildemara Querina Bomfim
Pastora da IPI da Lapa, SP
Administradora Geral da IPIB

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