Sermão

NO OLHO DA TEMPESTADE (ATOS 27.9-26)

As tempestades são ocorrências frequentes na natureza. Estão aí as erupções dos vulcões, os tremores de terra, os tornados, os ciclones. Todos arrasam tudo, deixam cidades destruídas, colheitas arruinadas e pessoas desabrigadas.

Assim como temos tempestades naturais, temos também as espirituais. Temos problemas, conflitos, dificuldades. Temos situações dramáticas que desabam sobre a nossa vida deixando atrás de si um rastro de destruição. Sonhos desfeitos, esperanças despedaçadas e realizações pulverizadas.

Estas tempestades não as queremos, mas elas não dependem de nós. Não há exceção, nem privilégio. Todos nós passamos pelas tempestades da vida. Todas as vezes que a nossa vida é obscurecida por uma nuvem escura que pressagia a tempestade nós temos medo.

Não há resposta clara para os nossos questionamentos na hora da tempestade e quase sempre um grande conflito espiritual se instala na nossa mente e coração. A primeira expressão deste grande conflito se dá entre a palavra de Deus e a realidade da vida.

Podemos observar isto na vida do apóstolo Paulo, mas darei dois exemplos.
Paulo foi chamado por Deus para o trabalho missionário. Ele queria ir à Ásia, mas o Espírito Santo impediu. Disse-lhe: “Não é à Ásia, mas à Europa”.

Paulo obedeceu. Seria natural esperar um trabalho bem sucedido e abençoado. Mas não foi isso o que aconteceu. Paulo foi surrado, arrastado ensanguentado, amarrado num tronco, ultrajado em público.

Onde estava Deus quando seu missionário foi humilhado em praça pública? Se Deus é amor, por que permitiu que Paulo sofresse? Se tem poder, por que não o livrou dos seus adversários? Como entender este conflito que se estabelece quando alguém, no centro da vontade de Deus, ao mesmo tempo tem de enfrentar uma terrível calamidade?

Deus queria que Paulo fosse a Roma. Ele tinha uma missão para Paulo na capital do Império Romano. Paulo obedeceu ao mandato divino. Tomou o navio e enfrentou uma terrível tempestade. Muito vento, tufão, escuridão, naufrágio.

Poderíamos perguntar também: Se era da vontade de Deus, por que uma viagem tão desastrosa? Como conciliar a ordem de Deus “Eu quero você em Roma, Paulo” com tantas tribulações?

É isso o que acontece também conosco. Talvez seja este o grande conflito de nossa vida.
A gente é fiel e obedece a Deus, mas, de repente, tem de enfrentar uma infinidade de problemas: desilusão, doença, dor, desemprego.

Mas este não é o único conflito provocado pelas tempestades da vida. Há outro além deste: o conflito espiritual. Conflito que nasce da necessidade urgente que sentimos e a demora de Deus.

Este é o grande conflito! A tempestade não passa. Demora um dia, dois, três, vários dias. Mas mais demorada que a tempestade é a demora de Deus.

Por que toda esta demora? Por que Deus demora em vir ao nosso socorro? Se Ele se importa conosco, por que não nos atende na hora em que clamamos? Se Ele nos quer bem, por que nos obriga a passar até os limites dos nossos recursos?

O tempo fechou. Mas não foi só o tempo que fechou. Os céus fecharam. Tudo se fez escuridão.

Em momento como estes, algumas das pessoas que nos cercam nos atingem com perguntas incômodas: “E o teu Deus onde está? Onde está o teu Deus em tudo isto? Se ele é bom, por que te abandonou? Se te ama, por que te deixa sozinho?”

E mais angustiante que as perguntas incômodas é a sensação da demora do socorro divino que nunca chega. No meio das tempestades da vida, temos a sensação desagradável de que Deus parece ficar surdo ao nosso clamor.

Muitas vezes passamos por vales escuros e temos a sensação de que, quanto mais oramos, mais as coisas se agravam.

Um dos grandes dilemas da vida cristã é exatamente o silêncio de Deus!

Muitas vezes, o Deus que fala poderosamente fica em silêncio. O Deus que falou pelos profetas fica calado. O Deus que fala através de seu filho, também permaneceu misteriosamente silencioso na cruz do Calvário.

E quando Deus fica em silêncio as vozes das dúvidas gritam dentro de nós. “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”

O povo de Israel passou 400 anos no Egito. Grande parte deste tempo em cativeiro, o povo clamou a Deus. Muitos oraram a vida toda e o único som que ouviram foi o estalo do chicote nas costas. E muitos clamaram em lágrimas, mas só ouviram um grande silêncio do céu por 400 anos.

Esta tensão entre o clamor humano e o silêncio do céu é dramaticamente retratada na vida de Jó. Por 16 vezes, ele levantou seu clamor a Deus perguntando: Por que tamanho sofrimento? Por que não morri no ventre de minha mãe? Por que o Senhor não me mata?

E a única resposta que Jó obteve foi um profundo silêncio de Deus. Nenhuma palavra lhe abriu as cavernas escuras de seu coração. Os céus permaneceram mudos diante de seus gemidos.

Talvez a maior angústia de Jó não fosse seu sofrimento, mas o silêncio do céu. O silêncio de Deus doía mais do que suas feridas. O silêncio de Deus era mais forte do que os gritos de sua alma e de seu coração. O silêncio de Deus era mais eloquente que as vozes da tempestade.

Mas Paulo nos mostra que é, no momento crítico, em meio à tempestade, que nós podemos ser mais do que vencedores. Ele sabia como vencer a tempestade da vida. Ele disse aos seus companheiros de tragédia: “Tenham coragem! Eu confio em Deus!” (At 27.25)

Nós encontramos com Paulo os segredos da vitória no meio da tempestade.

Primeiro segredo: O Deus de quem sou e a quem sirvo

Paulo deixa claro que o Deus ao qual pertencia e ao qual servia não é um Deus qualquer. Pode parecer demorado e silencioso, mas não é. O meu Deus fez o céu e a terra. O meu Deus está no olho da tempestade. O meu Deus está no olho da dor. O meu Deus está no olho do sofrimento e na situação mais adversa.

Deus dá sentido à tragédia! Acima das nuvens densas da tempestade está o desígnio providencial do Deus soberano! Deus é maior do que a tempestade!

Segundo segredo: No meio do desastre do natural há o toque do sobrenatural

No meio daquela tempestade terrível, Paulo recebeu a visita do anjo de Deus. O enviado de Deus no meio da tempestade veio dizer: “Não temas, Paulo!”

No meio da tempestade mais terrível, há e haverá sempre o recurso sobrenatural da graça de Deus: “A minha graça te basta!”

Não tema a tempestade, a minha graça te basta! Não tema a ventania, a minha graça te basta.

Terceiro segredo de Paulo: Confiança na promessa de Deus

“Senhores, tenham coragem, pois eu confio em Deus que sucederá do modo como foi dito.” Deus havia dito que nenhum mal aconteceria. O navio ficaria esfacelado, mas nenhuma vida se perderia.
A palavra do Senhor é para valer! Ela propicia uma atitude firme, corajosa, construtiva.

“Tenham coragem!” –  Quem dizia isto era um homem que carregava um espinho na carne, perseguido, náufrago, prisioneiro, picado por uma serpente.

Ele anima, exorta, incentiva, ora, agradece! Ele não se deixa abater! Ele não lamenta, não busca culpados, não grita desesperado em direção aos céus!

Ao contrário, ele confia naquele que disse: “No mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, porque eu venci o mundo”.

O ânimo do apóstolo faz com que todos recobrem o próprio ânimo. Paulo convida-nos a colocar dentro do navio da nossa existência, no momento mais duro da tempestade, a companhia maravilhosa de Jesus!

Sejam nossas as palavras do apóstolo: “Em todas as situações, temos a vitória completa por meio daquele que nos amou! Em todo o universo, não há nada que possa nos separar do amor de Deus, que é nosso por meio de Cristo Jesus, o nosso Senhor!” (Rm 8.37-39)

Rev. Abival Pires da Silveira
Pastor emérito da 1ª IPI de São Paulo, SP, falecido no dia 1º/9/2019

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