Vida Prática

A ADOLESCÊNCIA E A SOLIDÃO ATUAL

Nem todas as famílias e nem todos os professores estão percebendo o sofrimento dos adolescentes nesta pandemia com a obrigatoriedade do confinamento. Afinal, nas épocas normais, eles são tidos como rebeldes e, em alguns casos, até como marginais. Não é atoa que muitos adultos os denominem de “aborrescentes”.

Mas não pensem que este conceito é recente. Vejam o que disse um sacerdote do ano 2000 a. C.: “Nosso mundo atingiu seu ponto crítico. Os filhos já não ouvem mais os pais. O fim do mundo não pode estar longe”.

O adulto tem muita dificuldade para lembrar como foi a sua adolescência, ou faz questão de não lembrar. Por isso, quem teve problemas terá dificuldade para entender o filho.

Arthur Shopenhauer apresenta uma metáfora, mostrando que o adolescente experimenta uma condição que o aproxima do Porco Espinho que, nos dias de inverno, precisa se aconchegar, mas, ao mesmo tempo, sofre com os espinhos do outro. Ele faz parte de uma reunião de pessoas quem têm algo em comum: consegue “calor” na forma de aceitação e acolhimento, e, ao mesmo tempo, precisa se defender dos “espinhos”, posicionamentos que se chocam contra a sua individualidade.

O adolescente vive uma inquietude natural, pois o aumento da pressão arterial provocado pela desproporção entre o coração e as artérias obrigam-no a movimentações constantes, considerando seu rápido crescimento. Daí o descompasso com os demais membros da família.

A entrada no grupo é acontecimento inevitável de passagem da criança para o mundo adulto. Além da rede protetora da família, busca fora de casa outras referências para se formar como sujeito. Por meio deles, o jovem exercita papéis sociais, se identifica com valores e busca segurança para lutar contra a angústia da solidão típica da fase, acrescida pela pandemia.

No trato com o adolescente, temos que distinguir Grupo e Turma.

Grupo tem a ver com pessoas juntas circunstancialmente, que é a família, que procura, de alguma forma, compreendê-lo, nem sempre com o sucesso desejado.

E Turma tem a ver com os amigos e colegas, o que significa envolvimento afetivo maior, com um grande prazer pelo ajuntamento.

A turma tem a força de iguais, pois nela eles conseguem realizar compromissos ou aventuras que, individualmente, talvez nem fossem capazes de realizar ou nos quais não achariam tanta graça.

A solidão pesa muito. Ficar sozinho é sentido como um grande problema, aumentando sua irritação, o que deixa os demais familiares também em situação de desespero.

O adolescente não se contenta mais com a rede protetora da família e busca fora outras experiências para se formar como sujeito. É por isto que, nesta hora, os amigos crescem em importância.

A tentativa da escola em relação às aulas virtuais resolveu, em parte, o problema da quantidade de conteúdo, mas não eliminou a falta que as aulas presenciais fazem, principalmente quanto ao encontro dos colegas.

Mesmo com a possibilidade da volta às aulas com menos alunos, eles se ressentem de não poder abraçar, ficar juntos, rir, fofocar, bagunçar, etc.

Ser obrigado, em função da Covid-19, a ficar em casa, deixa o adolescente desesperado, razão pela qual arruma sempre uma desculpa para encontrar-se com os amigos, arriscando-se, muitas vezes em ajuntamentos sem os cuidados necessários, colaborando com a disseminação deste vírus mortal.

Portanto, que as famílias façam um grande esforço para envolver o adolescente, que tem dificuldade de expor o que está sentindo com uma paciência extra, em relação aos seus arroubos quase que inexplicáveis.

E todos verão, família e o adolescente, que o exercício da compreensão fará com que este momento passe o mais rápido possível.

Rev. Gerson Moraes de Araújo
Ministro jubilado da IPIB e capelão do Hospital Evangélico de Londrina, PR

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