Pastoral da Diretoria

Rei dos Reis

Nasce um rei em Belém. Belém da Judeia foi palco do nascimento de um rei. Aquele menino não foi um rei como qualquer outro que já governou em Israel ou Judá, mas o Rei dos reis. Seu nascimento gerou desconforto para os poderosos políticos e, pasmem!, também para os poderosos religiosos.
Um rei legítimo sempre provoca desconforto nos ilegítimos. A perturbação, por parte do rei Herodes, na época foi notória. Herodes se preocupava com o fato de que um rei romano em terras israelitas poderia não ser mais tolerado. Alguém imbuído de poder pelo Senado de Roma, sem a legitimação do povo, mostrava-se um governo fraco. Governos fracos precisam destruir todos que podem lhe fazer sombra. Por mais contraditório que pareça, Herodes sabia que a melhor forma de esconder sua fragilidade era usando de sua força.


A trama desta história faz questão de mostrar a sede de poder de um rei que, durante sua vida, assassinou esposa, filhos, cunhado, tio e muitos outros. De um lado, temos um rei que deseja se perpetuar no poder na renomada Jerusalém; por outro, acompanhamos a história de uma simples família em que a esposa, Maria, dá à luz a uma criança numa estrebaria nos arredores da pequena cidade de Belém.


Um rei ilegítimo se apavora no palácio. Uma criança inocente é acolhida pelos braços de sua mãe na estrebaria. Herodes se sente ameaçado. Jesus recém-nascido é a ameaça.

O cenário é conhecido por nós cristãos. O contexto histórico e cultural do primeiro século é estudado constantemente nos círculos acadêmicos e nas elaborações de mensagens pelos pastores e pastoras ao ministrar aos seus rebanhos no período do Natal.


Em meio à mensagem de boas notícias, é preciso observar o alerta que religiosos recebem na narrativa. Mateus 2.3-4 relata: “Tendo ouvido isso, alarmou-se o rei Herodes e, com ele, toda a Jerusalém; então, convocando todos os principais sacerdotes e escribas do povo, indagava deles onde o Cristo deveria nascer”.
Relembrar alguns episódios em torno do nascimento de Jesus nos ajudará a pensarmos como o cristianismo e a sociedade pós-moderna influenciam a nossa existência. Os textos bíblicos nos dão informações que precisam ser interpretadas e aplicadas à nossa vida.


O alerta no texto é profundo porque as comunidades cristãs podem tentar excluir a ação de Deus na história e servir a Herodes. São os próprios sacerdotes e escribas que municiam o representante do Estado para que ele use sua força e poder para tentar destruir a esperança dos que temiam a Deus e aguardavam a manifestação do seu Reino.


Aqueles que deveriam liderar a liturgia dos cultos e os que tinham a responsabilidade de interpretar as Escrituras não foram sensíveis à ação de Deus na história e deram ouvidos ao representante maior do Estado: Herodes, um rei ilegítimo.


Eles não só concederam todas as informações reveladas nas Escrituras sobre a promessa do Messias, que viria da descendência de Davi, nasceria em Belém, mas, posteriormente, validaram os clamores por crucificação do Rei dos reis.


O que mais nos assusta na narrativa bíblica é que os magos do Oriente tiveram uma percepção espiritual que os sacerdotes e escribas não tiveram.
Isto não lhe causa preocupação também?


Deus alertou, em sonho, aqueles que vieram do Oriente para conhecer o novo rei, mas não sensibilizou o coração e os ouvidos dos seus próprios sacerdotes e escribas.


Somos cientes de que os magos eram desprezados pelos judeus, considerados “abomináveis”, religiosos que eram guiados pelas estrelas, mas, de alguma forma, por provisão divina, foram guiados pelo próprio Senhor para cultuar e presentear a Jesus.


Não minimizemos o paradoxo que encontramos nestes textos, pois eles nos forçam a olhar mais atentamente para o Deus que se faz ser humano.
Talvez esses magos carregassem consigo um pouco da influência de Daniel e seus amigos, que serviram o governo babilônico, quando Judá estava no exílio. Mesmo muitos anos depois, os ensinos e a vida de Daniel, Sadraque, Mesaque e Abedenego afetavam os cidadãos, a cultura e a espiritualidade dos povos com os quais conviveram.


A narrativa destaca os sacerdotes, escribas, magos, Herodes e Jesus. Atualmente, precisamos estar muito atentos para não cairmos no erro de vivermos uma religiosidade mórbida e de cultivarmos uma secularização de nossa fé.


Até mesmo boas ações não significam, necessariamente, que estamos no caminho certo. Estudar as Escrituras, ser zeloso com os rituais eclesiásticos, manter a ortodoxia teológica e ter cautela com propostas de mudanças podem ser atitudes bem intencionadas. Contudo, não significam que, de fato, estamos sensíveis à voz de Deus.


Outro equívoco que não podemos permitir é a secularização de nossa fé. Muitos podem ser tentados a flexibilizar a teologia com o propósito de atender às demandas contemporâneas, de ceder ao relativismo moral com o objetivo de tornar a igreja mais acolhedora, de realizar mudanças pragmáticas visando a um crescimento imediato ou de realizar inclusões acríticas no seio da comunidade, acabando por fortalecer a cultura do prazer.


Diante de todos os desafios que enfrentamos, precisamos pedir que o Espírito Santo nos torne profundamente sensíveis com o propósito de não abandonarmos o projeto de Deus para assumirmos as pautas dos projetos de Herodes.


A insensibilidade pode nos impedir de ver claramente o caminho que estes projetos humanos têm tomado.
Avaliemos: como líderes preparados para o ofício religioso poderiam seguir um rei que tem histórico de abuso e violência, chegando ao ponto de assassinar crianças abaixo de dois anos para se perpetuar no poder?


Os teólogos e pastores, bem como grande parte do rebanho, foram afetados pelos poderes e promessas de Herodes no primeiro século. Como consequência, engajaram-se nos projetos humanos e não perceberam que o Senhor da História estava cumprindo suas promessas.


Crianças morreram porque pastores e teólogos do primeiro século estavam tão focados em seus compromissos ritualísticos e elaborações dogmáticas que não perceberam a ação de Deus na história e, ao invés de se engajarem na missão de Deus, tornaram-se súditos de Herodes.


Uma palavra de esperança para nós é que o Deus que se fez ser humano foi conhecido como Emanuel, que significava “Deus conosco”. Como não ser afetado por um Deus que se faz presente em nossas vidas?


A presença de Deus em nosso meio nos leva à transformação. Religiosos podem ser insensíveis à voz do Senhor e à sua ação na história, mas cristãos impactados pela graça de Deus, em Cristo Jesus, são sensíveis à atuação do Senhor e à sua boa, perfeita e agradável vontade.


Pessoas secularizadas podem não discernir os propósitos de Deus para a humanidade e não apresentar o evangelho que transforma vidas. Contudo, aquele que crê em Jesus e reconhece sua pecaminosidade é transformado dia após dia à imagem e semelhança de Jesus Cristo.
Portanto, neste Natal, precisamos tirar os olhos dos “Herodes” e de nós mesmos e voltá-los para Jesus Cristo.

Rev. Alex Sandro dos Santos
Pastor na 1a IPI de Machado, MG, e 1o secretário da Diretoria da Assembleia Geral da IPIB

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