Ministério da Comunicação

UMA LONGA CAMINHADA: COMUNICANDO AO CORAÇÃO DO POVO BRASILEIRO

O ano de 1864 não foi um ano qualquer. No início do mês de agosto, o império brasileiro entra em cena na guerra civil uruguaia entre blancos e colorados, apoiando estes, enquanto os blancos contavam com o apoio do Paraguai. Em 12/11/1864, o Brasil rompe relações diplomáticas com o Paraguai. A intervenção imperial brasileira foi um dos estopins para o que veio a ser conhecida como a “Guerra do Paraguai”, que teve o seu início em dezembro de 1864.

Em meio às tensões político-militares da época, em um sábado, no dia 5/11/1864, foi lançado o jornal “Imprensa Evangélica”, pelo Rev. Ashbel Green Simonton. No editorial de seu primeiro número, já era apresentada a ênfase de que o jornal trataria exclusivamente de interesses religiosos da sociedade e do indivíduo, ressaltando que não trataria de temas políticos. A vocação da “Imprensa Evangélica” era disponibilizar conteúdo para aqueles que não trairiam o “dom mais precioso de Deus — a liberdade de consciência perante o Evangelho”, conforme editorial.

Desde 1889, o Brasil não é mais um império, configurando-se como república. O país não tinha nem 3 anos ainda de experiência republicana quando, em 1892, foi inaugurado o famoso Viaduto do Chá na cidade de São Paulo e ocorreu a abertura da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, dentre outros eventos. Porém, outro fato importante marca esse ano. No dia 2/7/1892, circulou o último número de “Imprensa Evangélica”, com uma informação aos leitores e assinantes, conforme o português da época: “Por motivos de força maior, fica com este número suspensa a publicação da Imprensa até nova deliberação. Aos assignantes em atrazo pedimos o obséquio de mandarem saldar as suas contas. Os que pagaram suas assignaturas de 1892 serão indemnizados da quantia relativa ao semestre”.

Foram 27 anos de atuação ininterrupta: de 5/11/1864 a 2/7/1892, cumprindo o seu papel de ser um jornal religioso em nosso país. Embora não saibamos os motivos exatos de sua interrupção, sabemos que a sua semente continuou germinando e crescendo. Um dos seus frutos é o jornal “O Estandarte”, fundado pelos Revs. Eduardo Carlos Pereira e Bento Ferraz e pelo Presb. Joaquim Alves Corrêa, como sucessor de “Imprensa Evangélica”.

Exatos 10.290 dias separam essas duas publicações que são tão próximas!

Na primeira edição de “O Estandarte”, na apresentação escrita pelo major Remígio Cerqueira Leite, vemos a evolução proposta por essa nova linha editorial:

“Si, porém, de um lado, o atheismo, em todas as suas gradações, amesquinha e estiola o povo; de outro, a força é reconhecer que muito tem prejudicado à sociedade a concepção erronea da Divindade, a idéa falsa de Deus. O fanatismo brutal, a cruel intolerância, o puritanismo exclusivista dos phariseus hypocritas, tem bebido nesse manancial envenenado, suas atrozes inspirações. Ante essa dupla corrente do mal, ante a irreligiosidade materializadora e a crendice supersticiosa, ante a perversão da intelligencia e a consciência do homem, arvoramos, com mãos frageis, muito embora, o estandarte de uma concepção de Deus pura, santificadora e sublime. (…) É este o estandarte que, dilacerado, desbotado, por vezes, pelas rajadas ardentes do fanatismo apóstata, fluctua, não obstante, na cúpula de tudo quanto a civilização tem produzido de grande, nobre e duradouro. (…) Vimos occupar, na imprensa de nosso paiz, o lugar que, por largos annos, occupou a Imprensa Evangélica, há pouco extincta. Nosso programma, porém, é mais comprehensivo de accordo com os novos tempos. Sob as amplas dobras de nossa bandeira, abrigam-se todos os interesses legítimos da sociedade, principalmente os interesses moraes e religiosos. Procuraremos entrar na corrente do pensamento nacional e influenciar em sua direção”.

Depois de 127 anos, “O Estandarte” continua tremulando, sob a égide da “liberdade de consciência perante o Evangelho”, proclamada pela “Imprensa Evangélica” e com a mesma preocupação em dialogar com a sociedade, influenciando os seus caminhos, desde a sua primeira edição, em 1893.

As palavras iniciais no editorial de “O Estandarte”, escritas no distante 7/1/1893 parecem pintar um quadro duramente atual, da mesma forma que os seus desafios propostos à Igreja do Senhor Jesus:

“Nestes dias de grandes esperanças, bem como de graves perigos e crueis incertezas, offerecemos nosso pequeno contingente, reclamamos nosso quinhão de sacrifícios na consolidação de um regimen social de justiça, paz e liberdade”.

Dessa forma, lembramos que a nossa posição, enquanto Igreja de Jesus Cristo, é sinalizarmos o Reino de Deus, através da proclamação e vivência do evangelho em terras brasileiras, como tem sido feito há muito tempo, através da vida e testemunho de inúmeros irmãos e irmãs que vivem debaixo da liberdade de consciência perante o evangelho, reclamando nosso quinhão de sacrifícios na consolidação de um regime de justiça, paz e liberdade, para a glória de Deus!

Rev. Eugênio Anunciação
Pastor da IPI de Mogi das Cruzes, SP
Ministro da Comunicação da IPIB

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Morreu defendendo a liberdade

Mesmo após a assinatura da Lei Áurea pela princesa Isabel em 1888, extinguindo a escravidão no Brasil, vários fazendeiros mantiveram a escravidão em suas propriedades rurais na região de Brotas, SP, em flagrante desrespeito à lei. O major Remígio Antônio de Cerqueira Leite (patente concedida pelo imperador D. Pedro II) era proprietário da fazenda Gamelão, no mesmo município, e membro da Igreja Presbiteriana de Brotas. Advogado militante no fórum de Brotas e muito respeitado pelos juízes e promotores da região, por uma questão de consciência, oferecia esclarecimentos aos negros sobre a sua nova condição de vida, providenciando a lavratura de documento competente do fórum a todos que o procuravam.

A reação dos fazendeiros, que não aceitavam a nova lei e não queriam perder a mão de obra barata dos escravos, voltou-se contra o major. Deram-lhe um ultimato para que abandonasse a campanha de esclarecimentos, sob pena de pagar com a própria vida caso continuasse.

A resposta do major veio de imediato aos seus ameaçadores: “A minha consciência está acima de qualquer ameaça. Não desistirei desta empreitada!”  

Seus antigos escravos, agora livres, continuaram a trabalhar em sua fazenda. Mesmo antes do decreto, eles já gozavam de relativa liberdade, e tinham um grande apreço pelo patrão e sua família.

Ao saberem do perigo que o major corria, eles se revezavam na guarda da sede da fazenda durante a noite, defendendo-a de possíveis ataques de bandidos contratados pelos fazendeiros.

Foi no caminho entre a cidade de Brotas e a fazenda Gamelão, por volta da meia-noite, que os algozes atacaram o major Remígio. Eram três os bandidos.

Remígio Antônio de Cerqueira Leite estava acompanhado de seu filho mais velho, o Remiginho, que se salvou milagrosamente de um ferimento a facada na cabeça e conseguiu matar um dos bandidos. O major recriminou a reação do filho e morreu ajoelhado, orando.

O corpo do major não pôde ser sepultado no cemitério municipal de Brotas, por causa de sua opção religiosa. O clero católico não permitia que os protestantes fossem sepultados no mesmo cemitério que os católicos. O prefeito da época destinou um terreno fora da cidade para que ele fosse sepultado.

A polícia local conseguiu prender os dois bandidos. Ficaram presos na cadeia da cidade por algum tempo e foram soltos (os mandantes do crime pagaram as fianças).

 Mas não tiveram sorte na saída da prisão. Pararam numa fazenda para pedir alimentos para prosseguirem viagem. A fazenda era de uma sobrinha do major. Identificados pela família, foram abatidos pelos peões, quando andavam pela estrada.

Esta é a história do meu bisavô materno, que nasceu em São João de Jaguari, MG, no dia 8/7/1836, e faleceu no município de Brotas no dia 13/7/1894. Era irmão do Rev. Antônio Pedro de Cerqueira Leite, pastor presbiteriano.

 “Se o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres.”

Presb. Daltro Izídro dos Santos, membro da 1ª IPI de São Paulo, SP (texto publicado na Revista Alvorada, número 54, em 2008)

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